“Amada”, de Toni Morrison e outros livros premiados para o #LeituraPreta de fevereiro

Escrito por
Sérgio Motta

O mercado editorial é uma grande festa VIP. E na lista, dificilmente estão nomes de pessoas negras. Nós temos que dar um jeito: driblar a segurança, entrar pelos fundos, convencer um nome da lista a nos ajudar a entrar. E, para nos manter lá dentro, precisamos nos provar merecedores do espaço conquistado. Precisamos nos provar melhor do que os que já estão ali para sermos tratados com algum respeito.

Sempre batemos nessa tecla: dificilmente vamos nos deparar com um livro de autor negro ruim ou mediano. Não porque necessariamente todo autor negro escreve melhor que autores brancos, mas porque nós só nos mantemos na festa VIP se formos excelentes e nos provamos diariamente.

Uma dessas formas, é através dos prêmios, sobretudo ganhados em academias em que a cultura, jurados, conselho e participantes é majoritariamente rica e branca. Por isso, a categoria do #LeituraPreta de fevereiro é ler um livro premiado de um autor negro. A nossa leitura oficial, como não poderia ser diferente, é “Amada”, de Toni Morisson. Afinal, é um livro que não só rendeu um Pulitzer para autora em 1988, como permitiu que ela ganhasse um Nobel de Literatura em 1993. Nada mais justo do que prestigiar essa grande escritora que nos deixou em 2019.

“Amada” também foi eleito pelo New York Times a obra de ficção mais importante dos últimos 25 anos nos Estados Unidos. Em 1998 recebeu uma adaptação cinematográfica, “Bem-amada”, com Oprah Winfrey no papel principal. A obra-prima de Morisson é inspirada em uma história real, fazendo um retrato ao mesmo tempo lírico e cruel da condição do negro no fim do século XIX nos Estados Unidos.

Além de “Amada”, aqui vão outras dicas de livros premiados para você escolher!

#LeituraPreta de fevereiro: livros premiados

“Olhos d’água”, Conceição Evaristo
Nessa coletânea, Conceição ajusta o foco de seu interesse na população afro-brasileira abordando, sem meias palavras, a pobreza e a violência urbana que a acometem. Um livro difícil de digerir, com uma escrita fácil de se admirar. A obra rendeu a Conceição Evaristo o prêmio Jabuti de 2015 na categoria “Contos e crônicas”.

“Americanah”, Chimamanda Ngozi Adichie
Vencedor do National Book Critics Circle Award de 2013, e finalista do Women’s Prize de 2014, este é um dos livros mais intensos da última década. O livro mostra todas as facetas do racismo e das vivências negras, à partir da ótica de um casal nigeriano separado pelas circunstâncias da vida.

“O Ódio Que Você Semeia”, Angie Thomas
Este livro dispensa apresentações. Além de ganhar o prêmio William C. Morris por livro de estreia jovem-adulto, quebrou recordes de venda, figurando por mais de três anos na lista de mais vendidos do New York Times, sendo boa parte no topo da lista. Uma obra que mostra como a violência imposta pelo Estado contra a população negra incita o ódio nas próximas gerações e, cada vez mais, a população negra é obrigada a se acostumar ao cotidiano violento.

“A Quinta Estação”, N.K. Jemisin
O marido de Essun assassinou seu filho e sequestrou sua filha. A maior cidade da Quietude, nação em que Essun vive, é destruída por um homem. Uma fenda vermelha se abre no céu de Quietude, expelindo cinzas que transformam o dia em noite por séculos. Tudo isso, no mesmo dia! Essun tenta ser mãe, cidadã e humana em um mundo que nada disso lhe é permitido. Caso você já tenha lido “A quinta estação”, aproveite para ler as sequências “O portão do obelisco” e “O céu de pedra”, pois os três foram vencedores do Hugo Awards, tornando Jemisin a única pessoa na história a ganhar três Hugo’s de melhor romance seguidos.

Capa do livro "Minha história", de Michelle Obama, publicada pela Companhia das Letras

“Minha história”, Michelle Obama
A única primeira-dama negra dos Estados Unidos nos conta a sua história. Michelle Obama que nos permite sonhar, pensar em um futuro melhor, como já contamos na nossa resenha de “Minha história”. A obra aclamada no mundo todo, ganhou o NAACP Image Award Outstanding Literary Work de melhor biografia em 2019, além do audiolivro, narrado pela própria Michelle, ter ganho o British Book Awards 2019 e um Grammy este ano.

“O sol na cabeça”, Geovani Martins
Recém-vencedor do Prêmio Rio de Literatura, o livro de estreia de Geovani já foi vendido em outros nove países. A obra traz treze contos sobre a infância e a adolescência de moradores de favelas do Rio de Janeiro — desde o prazer dos banhos de mar às brincadeiras de rua, paqueras e baseados —, moduladas pela violência e pela discriminação racial.

“Quem teme a morte”, Nnedi Okorafor
Filha de uma mãe estuprada após o massacre de toda sua tribo, Onyesonwu é ensinada por um xamã e descobre que seu destino mágico é acabar com o genocídio de seu povo. Explore uma África pós-apocalíptica no romance ganhador do Prêmio World Fantasy de 2011. Fica também a recomendação para quem sabe ler em inglês: a trilogia de novelas Binti, também de Nnedi Okorafor, é vencedora do Hugo de 2016 e Nebula de 2015, os dois maiores prêmios do mundo nos gêneros de ficção científica e fantasia.

“Breve história de sete assassinatos”, Marlon James
Uma ficção extraordinária em volta de um contexto real: a tentativa de assassinato de Bob Marley em 1976. A história explora os eventos e personagens em torno desse fato, durante a turbulência política na Jamaica na década de 70. A obra ganhou o Booker Prize e American Book Award de 2015.

“Assim na terra como embaixo da terra”, Ana Paula Maia
A história se passa em um presídio isolado das vistas da população em um local historicamente conhecido por torturar e assassinar escravizados. E um carcereiro decide promover uma caça esportiva no local para matar o tempo. A caça? Os prisioneiros. O cenário mais perverso possível (atenção a palavra “possível”) para vidas negras. Este livro rendeu a Ana Paula Maia seu primeiro Prêmio São Paulo de Literatura.

“Enterre seus mortos”, Ana Paula Maia
E este, o segundo. Ana Paula Maia é a primeira pessoa a ganhar o Prêmio São Paulo de Literatura por dois anos consecutivos. Edgar Wilson, personagem de outras obras da autora, aparece neste livro em um novo trabalho: recolhe animais mortos nas estradas e os leva a um depósito para serem triturados. A rotina muda ao se deparar com uma mulher enforcada dentro da mata. Edgar decide levar aquele corpo para dar um fenecimento digno à mulher, mas nada, absolutamente nada, dá certo e uma sucessão de problemas inesperados vão acontecendo. Uma habilidosa mescla de novela policial, faroeste de horror e romance filosófico com um tom de Kafka, Faulkner e Tarantino.

“O caminho de casa”, Yaa Gyasi
Para quem gosta de romance histórico, este é o seu livro. Duas irmãs que não se conhecem, nascidas em povos rivais de Gana: Fanti e Ashanti. Ambas tiveram destinos bem diferentes à chegada dos colonos escravagistas ingleses: enquanto Esi é escravizada, Effia é comprada por para ser “esposa” de um nobre inglês. Acompanhamos, então, a história de sete gerações de cada uma dessas famílias e como tudo é bem diferente entre elas, exceto o racismo e os danos da supremacia branca euro-americana sobre a África. O livro ganhou o prêmio de melhor livro de estreia do National Book Critics John Leonard Award em 2016 e o American Book Award de 2017.

Capa de "Redemoinho em dia quente", livro de Jarid Arraes.

“Redemoinho em dia quente”, de Jarid Arraes
Uma das principais vozes da literatura contemporânea, Jarid Arraes traz um livro de contos sobre mulheres brasileiras, especificamente da região do Cariri cearense, que não se encaixam em padrões e desafiam expectativas. O livro venceu o prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) de Literatura de 2019 na categoria contos e crônicas. Leia nossa resenha de “Redemoinho em dia quente”.

“Luanda, Lisboa, Paraíso”, Djaimilia Pereira de Almeida
Uma história de um pai e filho que vão de Angola para Portugal atrás de um tratamento médico, mas não é tão fácil enfrentar os preconceitos de um país branco e colonial. A obra venceu o Prêmio Oceanos, um dos maiores prêmios de literatura em língua portuguesa, tornando-se a primeira e única autora africana e negra a ganhar o prêmio.

“Babel-17 / Estrela Imperial”, Samuel R. Delany
Samuel Delany é um dos primeiros nomes citados como autores afrofuturistas. Em “Babel-17”, ganhador da segunda edição do Nebula em 1967, Rydra Wong é a poeta mais popular das cinco galáxias conhecidas. Além disso, é especialista em códigos. Em estado de guerra, ela é chamada pelas Forças Armadas para quebrar uma codificação em ondas sonoras do governo inimigo, mas descobre que se trata, na verdade, de um idioma supersofisticado. A novela “Estrela Imperial” não é premiada (mas aproveita pra ler também porque é boa demais!). É interessante ver como grandes obras da ficção científica atual bebem dessa fonte chamada Samuel Delany.

“Angola Janga”, Marcelo D. Salete
A obra é resultado de onze anos sobre a história de Palmares, uma rebelião que se tornou nação, referência maior da luta contra a opressão e o racismo no Brasil. Um épico no qual o destino do país é decidido em batalhas sangrentas, mas que demonstra a delicada flexibilidade da resistência às derrotas. A HQ ganhadora do Jabuti de 2018, retratam Zumbi, Ganga Zumba, Domingos Jorge Velho, Ganga Zona e diversos outros homens e mulheres que compõe o retrato de um momento definidor do Brasil.

“A cor púrpura”, Alice Walker
O romance, narrado em cartas escritas pela protagonista, Celie, retrata de forma intensa o racismo e misoginia no sul dos Estados Unidos, retratando abusos sexuais e violências físicas e psicológicas. Para sobreviver, Celie tem que se manter calada e obediente. Expressa-se apenas pelas cartas — para Deus e sua irmã Nettie, uma missionária na África — nunca enviadas. A obra ganhou um National Book Award e um Pulitzer Prize em 1983.

“Bem-Vindos ao Paraíso”, Nicole Dennis-Benn
Margot trabalha como prostituta próxima às paradisíacas praias da Jamaica para manter sua irmã mais nova na escola. Uma nova esperança surge quando um novo hotel começa a ser construído em sua vila: Margot espera conseguir independência financeira e ainda assumir seu amor proibido por outra mulher. O livro foi considerado o melhor livro de ficção lésbico do Lambda Literary Award de 2017, prêmio focado em literatura LGBTQ+.

Livro Filhos de Sangue e Osso, por Tomi Adeyemi

“Filhos de Sangue e Osso”, de Tomi Adeyemi
O livro é o primeiro de uma trilogia de fantasia baseada na cultura iorubá que está sendo adaptada para o cinema. No reino de Orïsha, a magia foi tomada dos majis. A sobrevivente Zélie busca trazê-la de volta e atacar a monarquia. A obra ganhou um Nebula em 2018 e um Hugo em 2019 como melhor livro jovem-adulto de fantasia. Leia a nossa resenha de “Filhos de sangue e osso”.

“Jeremias. Pele”, Rafael Calça e Jefferson Costa
Atual campeão do Jabuti de melhor história em quadrinhos, esta reinterpretação ousada, porém necessária, dá vida a uma história forte, dura, emocionante, na qual Jeremias lidará pela primeira vez com o preconceito por causa da cor da sua pele. A história é recheada de dor, superação, aprendizado e preparação para a vida.

“Canção de ninar”, Leïla Slimani
Um casal francês encontra uma babá perfeita, até demais, para cuidar de seus dois filhos. Mas o relacionamento entre o casal e a babá logo se torna cheio de ciúmes, ressentimentos e suspeitas. Com uma tensão crescente construída desde as primeiras linhas, o romance trata de questões que revelam a essência de nossos tempos, abordando as relações de poder, os preconceitos entre classes e culturas, o papel da mulher na sociedade e as cobranças envolvendo a maternidade.

“A poeta X”, Elizabeth Acevedo
Este livro aborda dúvidas e experiências frequentes da adolescência — religião, relacionamento e autoaceitação —, apresentando essas questões por meio das lentes da herança afro-latina de Xiomara. A autora elevou o romance escrito em verso a uma ferramenta poderosa, fornecendo aos leitores uma narrativa incrivelmente viciante e deliciosamente rítmica. Além de trazer um ponto de vista único para aqueles que convivem com todo tipo de preconceito e procuram por si mesmos na literatura e na vida.

“Daqui pra baixo”, de Jason Reynolds
Vencedor do Prêmio Edgar por melhor livro jovem-adulto, além de receber o Newbery Honor, e o Printz Honor Book em 2018, o livro conta a história de Will, um menino negro de 15 anos, que teve seu irmão morto a bala por uma pessoa. Depois de matar outra pessoa. Que matou outra pessoa. Que matou outra pessoa. Que matou outra pessoa. Uma história de vingança sem fim. Will é o próximo a entrar no ciclo: pegou a arma do irmão e saiu para se vingar. Mas no elevador do prédio que mora encontra as vítimas desse maquinário de vingança e percebe que é como aquele elevador. O buraco só se torna mais fundo e todos os envolvidos, afundam. Uma experiência completa de leitura, estrutura e design.


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