Não Seja Uma “Cara Gente Branca”

Escrito por
Lorrane Fortunato


Dia 28 de abril, estreou na Netflix a série Dear White People, baseado no filme de mesmo nome, premiado em 2014 no Festival de Sundance. 


Não conhece a série? Aposto que já ouviu falar dela. No dia 08 de fevereiro a Netflix divulgou um teaser de apenas 35 segundos que causou revolta por parte de muitas pessoas brancas.


O motivo? No vídeo a protagonista faz uma lista de fantasias aceitáveis para o Halloween e destaca que no topo das inaceitáveis, está ela. Essa é uma crítica direta ao blackface. 

Resultado? Muitas pessoas – brancas – ficaram ofendidas com o vídeo e resolveram se rebelar na internet. Chegaram até a dizer que a série apoia o ‘racismo reverso’ – vale destacar que isso não existe – e o genocídio de pessoas brancas – sério mesmo? Muitos até subiram as hastags #NoNetflix e #BoycottNetflix, alguns inclusive cancelaram suas assinaturas do serviço de streaming e fizeram questão de anunciar isso. 


Acredito que eu não preciso nem ressaltar o quanto é ridículo criticar uma série e propor um boicote se baseando apenas em um vídeo de 35 segundos. Vale lembrar que para criticar algo, você precisa conhecer.

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A Série

Dear White People (ou Cara Gente Branca) surpreende e de uma forma positiva. O objetivo da série não é  fazer um discurso de ódio contra os racistas ou com os brancos, no geral ou qualquer coisa do tipo.


Nela encontramos uma crítica ao racismo diário, o racismo que no momento, é tão presente nas nossas vidas quanto era no passado, porém, agora ele é velado, disfarçado de opinião. 


Uma das coisas mais incríveis em Dear White People é o fato de cada episódio ser dedicado a alguém, sendo assim, conhecemos melhor cada personagem e conseguimos quebrar os esteriótipos relacionados as pessoas negras, ao mesmo tempo em que, é mostrado o pluralismo negro.


Incrível, mas, muita gente ainda acha que todos os negros são iguais, pensam iguais, agem iguais. E como em qualquer outro povo, os seres são únicos. Nenhum ser humano é igual ao outro e é ótimo que isso seja reforçado. 


O racismo é exposto, em alguns momentos, de uma forma até mesmo irônica e divertida. O objetivo é mostrar o quanto sem sentido e ridículo ele é. 


Gosto também da forma como os personagens são apresentados, na série não vemos o maniqueísmo, nenhum é perfeito, nenhum é inteiramente bom ou inteiramente mal e isso só dá mais credibilidade e realismo a trama. 


Acredito que Dear White People é um presente de um negro para milhares de negros. É uma forma de nos representar e nos encorajar. A série é um grito, um punho erguido, uma voz que não se calou. Ela nos incentiva a não desistir, não calar, não parar de lutar, a sobreviver. Persistir e existir ainda são ótimas formas de protesto. 

“Espero que ainda estejam aí,
porque com certeza, o racismo ainda está.”



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Não Seja Uma “Cara Gente Branca”

O racismo é algo que nos cerca, ele é real. Não é uma coisa que só acontece com pessoas dos lugares x ou y. Ele está aqui, a nossa volta. Acontece comigo, acontece com você, com seus familiares e amigos, com seus irmãos de raça. O racismo mata, o racismo humilha, o racismo deixa marcas profundas. Acreditar que ele faz parte do passado é algo, no mínimo, ingênuo. 


Você branco, só há uma coisa que posso te pedir: não seja uma ‘cara gente branca’. “Como eu posso fazer isso?” Você talvez possa se perguntar, vamos a um manual bem básico. 


1 – Não seja racista;
Pode parecer algo até bem óbvio, mas, infelizmente tem muita gente que ainda não entendeu. Ser racista não é apenas chamar negros de ‘macacos’. Não vale dizer: ‘não sou racista, tenho até amigos negros’. 


Se você numa rua deserta, vê um negro e presume que ele irá te assaltar, você é racista. Se você vê uma mulher bonita mas, acredita que por ela ser negra é apenas uma mulher pra ter um caso, pra um sexo casual, você também é racista. Se você ‘não é preconceituoso, mas,’ acredita que a pessoa negra é inferior intelectualmente, que é desonesta, preguiçosa, que não pode assumir um cargo elevado, que ‘negro se não caga na entrada, caga na saída’ ou qualquer coisa assim, adivinhe? Você é racista. 


Não adianta reclamar, não adianta chorar, não adianta fazer discursos. Aceite, aceite isso e mude. Repense suas atitudes diárias, você pode levar a bandeira de ‘não preconceituoso’ mas, agir como um diariamente. As vezes, sem nem perceber.


2 – Aceite críticas; 
Se uma pessoa negra vira pra você e diz: não faça tal coisa, não use tal expressão, você me ofendeu, etc; apenas aceite. Não crie confusão, não fique reclamando e chorando suas mágoas, peça desculpas e lembre de não repetir.


Ninguém está te chamando de racista, ninguém está mandando te prender. A pessoa está apenas mostrando que aquilo que você disse / fez é racista.
Não importa se ela é sua amiga ou não. Não importa se você não acha que foi ofensivo, não importa se não foi a sua intenção.
 Aceite, apenas aceite. 


3 – Não diga que você sabe como é sofrer racismo;
Não adianta, amigx. Não importa se você não tenha uma gota de racismo no seu sangue, por mais bem intencionado que você seja, nunca saberá como é ser negro. 


Você pode imaginar, você pode até se esforçar muito, mas, não, você não sabe e nunca irá saber. Não adianta. Então, não force a barra, ok? 


4 – Respeite;
Eu não sou um animal num zoológico, não sou sua atração. Não toque no meu cabelo se eu não tiver te dado permissão antes, não me olhe como se eu fosse algo de outro planeta, não eu não sou exótica, eu sou apenas um ser humano. Eu sou um ser humano como você, e como tal, mereço respeito.


5 – Não diga ‘mimimi’;
Expôr o racismo não é vitimismo. E não, racismo não é mimimi. Assim como ter depressão, assim como expor a homofobia e qualquer outro tipo de preconceito não é mimimi, são coisas reais, são coisas que acontecem.


Não feche os olhos, não finja que não existe, admitir que o racismo existe é o maior passo para não ser um “Cara Gente Branca”. Não vire as costas para essa causa, assim como aconteceu com 13 Reasons Why, faça textões, faça campanha, critique, converse, questione. 
Quer mudar o mundo? Comece por si mesmo, seja você a sua primeira grande mudança. 


“Entendo que ser reduzido com uma generalização com base em raça, é uma experiência nova e devastadora para alguns de vocês, mas esta é a diferença: minhas piadas não prendem seus jovens em níveis alarmantes, nem tornam perigoso você andar no seu próprio bairro, mas, as de vocês, sim.






Quando zombam ou nos menosprezam, vocês reforçam um sistema existente.


Policiais apontando uma arma para um negro, não veem um ser humano.

Eles veem uma caricatura. 
Um bandido. 
Um preto.”