Nossas leituras favoritas de 2019

Escrito por
Sérgio Motta

O Resistência Afroliterária nasceu este ano como um canal de divulgação e promoção de literatura negra pelo Brasil. E, felizmente, por conta deste canal, tivemos a oportunidade de entrar em contato com muitas obras espetaculares de autores negros. Agora que o ano está acabando, vamos deixar para vocês recomendações de nossas leituras favoritas desse ano para você também ler em 2020! Lembrando que não tem ordem definida, porque… bom, são todos ótimos e não temos condições de ranqueá-los.

“Eles”, Vagner Amaro

O primeiro livro que li que discute masculinidades negras. Em contos curtos e intensos, Vagner Amaro nos apresenta personagens que são causas e consequências dos danos que os preconceitos, inferiorizações e desumanizações geram na nossa sociedade. A dificuldade da auto-idenficação, da demonstração de sentimentos e afetos, traumas, desenvolvimento, infância. Um livro que mostra como um abismo chama outro abismo.

Leiam e releiam e releiam “Eles”.

“Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis”, Jarid Arraes

Esse livro é uma bomba de emoções. Mulheres negras do Brasil raramente mencionadas ou reconhecidas por sua importância histórica, retratadas de uma maneira belíssima, em cordéis com palavras clinicamente selecionadas e um ritmo encantador.

O único e grande aspecto positivo de não ter conhecido a história da maioria dessas mulheres antes, é ter conhecido pelas mãos de Jarid Arraes. Não foi à toa que colocamos este livro também como um dos mais importantes da década entre escritores nacionais negros.

Leia “Heroínas negras brasileiras em 15 cordéis”.

“Rastros de resistência”, Ale Santos

Foto do livro "Rastros de resistência: histórias de luta e liberdade do povo negro", de Ale Santos

Por falar em personalidades negras históricas sendo retratadas… bom, a essa altura, se você vive no país Twitter, provavelmente já viu o trabalho do Ale Santos (@savagefiction). Ele ficou conhecido na plataforma por fazer fios de tweets, contando histórias de personalidades, povos e movimentos que ou representam o levante negro ou que fomentaram o racismo europeu em detrimento do povo negro.

Dentre estes fios, foi feita uma seleção, que foi reescrita e adaptada pelo próprio Ale para resultar em um projeto gráfico fantástico no livro “Rastros de resistência: histórias de luta e liberdade do povo negro” com prefácio do Emicida. Um livro tão importante quanto “Heroínas negras” e que também figura nossa lista de livros mais importantes da década.

Leia “Rastros de resistência” e siga o Ale Santos no Twitter para mais histórias.

“Kindred”, Octavia E. Butler

Comecei a escrever sobre poder porque era algo que eu tinha muito pouco

É simples: para “Kindred” não figurar uma lista de “favoritos” ou “melhores”, só se ela não se encaixar na categoria da lista. Octavia E. Butler é simplesmente conhecida como “A primeira dama da ficção científica”, além de ser recordista em prêmios literários. E não é à toa.

Esta é a obra mais humana de ficção científica que já li. Ninguém cria tipos tão próximos, reais e amigos na literatura fantástica quanto Butler. É uma obra que transcende gêneros e épocas. Uma obra de arte clássica e atemporal. Falamos mais disso na nossa resenha de “Kindred” e recomendamos a leitura (da resenha e da obra).

Já leu a resenha? Agora, leia “Kindred”.

“O ceifador” e “A nuvem”, Neal Shusterman

Vamos dar uma roubadinha aqui e recomendar esses dois livros, pois devoramos em sequência (e estamos desesperados pelo terceiro). Uma das frases mais ditas por aqui, para quem quer que seja, foi “você precisa ler ‘O ceifador’ agora!”, seguida por “Termina logo para ler ‘A nuvem’!”. A história se passa em um mundo que a morte já não é a única certeza na vida do ser humano. Uma utopia em que a fome, miséria, doenças já não existem e o ser humano tornou-se naturalmente imortal. Mas para o bem geral de todos, a fim de impedir o crescimento populacional desenfreado, existem os ceifadores.

Ceifadores não são assassinos. Na verdade, se gostarem de matar, perdem sua humanidade e não servem ao cargo. Neal faz neste livro a subversão da subversão em cada tropo que nos apresenta, gerando dilemas morais entre os personagens que os tornam os personagens cada vez mais instigantes e tão próximos que nos pegamos pensando o que faríamos no lugar deles.

Leia “O ceifador” e “A nuvem”.

“Fantasma”, Jason Reynolds

Um livro delicioso para se ler numa tarde. “Fantasma” é uma obra apaixonante desde a capa. Simples, amistosa, confortável, assim como a própria escrita de Jason Reynolds.

Ilustração da capa do livro "Fantasma", de Jason Reynolds

O grande mérito do autor é expôr nesse livro questões pesadas como o racismo, violência doméstica, traumas e preterismo de pessoas negras sem precisar apelar para uma narrativa pesada, hiperdramática ou politizadora. É, com certeza, a continuação que mais aguardo em 2020.

Leia “Fantasma”.

“Reticências”, Solaine Chioro

Um romance moderninho de vez em quando também é bom pra todo mundo, não? Solaine Chioro nos dá uma dose de carinho através de um romance que começou por uma conexão nas redes sociais, mas que no offline, sem saberem um do outro, rola um certo conflito logo de cara.

“Reticências” é aquela nossa comédia romântica do dia a dia, só que não. No lugar dos casais brancos, loiros, sarados e rasos, este livro tem protagonistas negros, gordos e muito mais interessantes.

Leia “Reticências”.

“A parábola do semeador”, Octavia E. Butler

Se tivéssemos lido dez livros da Octavia E. Butler este ano, provavelmente essa lista seria com os dez. Mas em 2019 lemos apenas dois. Vergonhoso, sabemos. É para isso que 2020 está aí, para compensarmos essa falha.

Mas falando de “A parábola do semeador”, o que podemos dizer, é: leia! Principalmente para o momento em que vivemos. Embora o livro seja uma distopia escrita em 1993, você sentirá como se estivesse lendo um livro documental em 2020. Pois a história se passa na década de 2020 e em um mundo que entrou em uma ferrenha crise após o colapso ambiental, crescente desigualdade de riqueza e ganância corporativa. Lembra alguma coisa? Se tivéssemos que recomendar apenas um livro para ler em 2020, seria esse.

Está recomendado: leia “A parábola do semeador”.

“Filhos de Sangue e Osso”, Tomi Adeyemi

Falando em continuações esperadas… está aí um livro que, como fã de alta fantasia, sempre quis ler. Batalhas, guerras, mortes, aprendizado, magia, tirania, criaturas fantásticas, escolhidos, divindades… só que nada de Europa medieval como cenário e cultura celta como base mitológica. Estamos falando de uma alta fantasia em África, com todos os personagens negros e com magias provenientes da conexão ancestral com orixás.

“A realidade nos dizia que fracassaríamos. Mas nós lutamos, lutamos. Perseveramos. Nos erguemos.”

E, além de tudo, é um livro feito para o negro brasileiro. Explicamos mais sobre isso na nossa resenha de “Filhos de sangue e osso”. A continuação da obra, “Filhos de virtude e vingança” [tradução livre] já foi publicada em inglês e a série está sendo adaptado para o cinema. Ansioso é pouco para ler a continuação em 2020.

Leia “Filhos de sangue e osso”.

“Daqui pra baixo”, Jason Reynolds

Ok, confesso: estou apaixonado pela escrita desse homem. Eu devorei “Fantasma” e “Daqui pra baixo” em sequência. E, embora se perceba a delicadeza junto dinamicidade do autor nas duas obras, Daqui pra baixo se destaca pela estrutura poética e pelo projeto editorial.

As regras
Nº1: não chorar
Nº2: não dedurar
Nº3: se vingar

Este livro conta a história de Will, um menino negro de 15 anos, que teve seu irmão morto a bala por uma pessoa. Depois de matar outra pessoa. Que matou outra pessoa. Que matou outra pessoa. Que matou outra pessoa. Uma história de vingança sem fim. Will é o próximo a entrar no ciclo: pegou a arma do irmão e saiu para se vingar. Mas no elevador do prédio que mora encontra as vítimas desse maquinário de vingança e percebe que é como aquele elevador. O buraco só se torna mais fundo e todos os envolvidos, afundam. E a grande questão é: matar o assassino de seu irmão mudará algo nesse cotidiano violento?

Leia “Daqui pra baixo”.


Essa é nossa lista das leituras favoritas de 2019. Muita coisa ficou de fora, mas você pode acompanhar todos os livros de autores negros que lemos este ano na thread abaixo:

Que em 2020 tenhamos cada vez mais grandes autores negros publicados e compartilhemos cada vez mais nossas experiências. Feliz ano novo!


Descubra mais sobre Resistência Afroliterária

Assine para receber os posts mais recentes por e-mail.